5 de maio de 2020

Bezerra, o apóstolo da Unificação



No dia 16 de agosto de 1886 havia cerca de duas mil pessoas no salão de honra da Guarda Velha, participando de um ciclo de conferências organizado pela Federação Espírita Brasileira. Elas assistiram emocionadas e atônitas  à conferência do homem que era o médico (alopata) dos pobres há trinta anos, foi eminente político de 1860 a 1885, e também desempenhava destacada função de jornalista, Dr. Adolfo Bezerra de Menezes Cavalcanti.[1] Amigo de todos os diretores da Federação, ele anunciava ali, em alto e bom som, a sua adesão ao Espiritismo.

Grande foi a repercussão provocada em toda a cidade do Rio de Janeiro e até mesmo em outros estados, pois o público, até então, desconhecia que aquele ilustre cidadão cearense já estudava a Doutrina dos Espíritos desde 1876, aproximadamente, quando recebeu das mãos do Dr. Joaquim Carlos Travassos –primeiro a empreender a tradução das obras de Kardec no Brasil e Secretário-Geral do Grupo Confucius– como presente, um exemplar de O Livro dos Espíritos, com dedicatória.

Entre os diversos subgrupos[2] espíritas da época houve grande contentamento com os resultados e consequências daquela conferência, pois as livrarias venderam mais livros espíritas, a Federação cresceu em adesões de Grupos Espíritas, os círculos do catolicismo agitaram-se e alguns fizeram ataques por cartas ou através de artigos publicados na imprensa ao homem e à Doutrina Espírita. Com muita sabedoria, conhecimento doutrinário, teológico, filosófico e possuidor de verbo fácil, o Dr. Bezerra de Menezes escrevia seus comentários e replicava com lúcidos e indiscutíveis argumentos, em cartas ou também através da imprensa, as agressões que recebia ou que eram dirigidas ao Espiritismo.

Em face disso, foi convidado pela União Espírita do Brasil a escrever, para ser publicada no jornal de maior circulação da época, O Paiz (dirigido por Quintino Bocaiuva, que pouco depois se tornou espírita), a série de “Estudos Filosóficos”, cujo título era “Espiritismo”. No período de novembro de 1886 a dezembro de 1893, sob o pseudônimo de Max, seus artigos foram publicados ininterruptamente, aos domingos, marcando assim a melhor época da divulgação do Espiritismo no Brasil. Estes artigos foram, mais tarde, reunidos em três volumes e publicados em formato de livros. Nesta mesma época, ele escreveu o romance “A Casa Mal Assombrada” e ainda “Lázaro, o leproso”. Simultaneamente à essa volumosa produção intelectual, num intervalo de um ano e meio, Bezerra enfrentou a perda de três de seus filhos.

Em abril de 1889, Bezerra de Menezes assumiu a presidência da FEB, onde instalou o primeiro “curso de desenvolvimento da mediunidade” no país. Levava consigo o objetivo de conseguir reunir os espíritas brasileiros em torno da Doutrina dos Espíritos, praticando a fraternidade ensinada no Evangelho, sob o lema da Bandeira de Ismael: Deus, Cristo e Caridade. Entretanto, os espíritas de então pareciam refratários aos apelos que lhes foram dirigidos por Allan Kardec e Ismael, através das mensagens por eles enviadas. Pouco tempo depois deixou o cargo, passando a exercer o de vice presidente em 1890 e 1891, ocasião em que vários grupos reduziram ou encerraram suas atividades por causa das incursões e perseguições arbitrárias promovidas pela polícia nos mais variados setores da sociedade, em busca de possíveis elementos contrários à República recém instalada no Brasil. Após esse tempo se afastou da FEB, mas não interrompeu suas atividades costumeiras no Espiritismo, assim como, jamais deixou de exercer algum trabalho profissional.

Em 1895 Dr. Bezerra de Menezes foi convidado a reassumir a presidência da FEB, pois grande era a dispersão dos elementos no movimento espírita. Inicialmente recusou o convite por diversas razões, mas lhe foi oferecida autonomia total para dirigir os destinos da instituição e, embora tenha ficado sensibilizado com o convite, preferiu ouvir o seu Mentor Espiritual antes de dar uma resposta definitiva. Assim, em reunião mediúnica no Grupo Ismael (que ele frequentava regularmente), em julho daquele ano, na qual também estava presente Bittencourt Sampaio, que ponderou favoravelmente a aceitação do convite pelo médico dos pobres, foi ouvido o Espírito Agostinho, através do médium Frederico Júnior, falando da necessidade e urgência de se aceitar aquele convite, pois que, era um chamado e que a união dos espíritas e a sua orientação haviam sido confiadas pela espiritualidade a ele, Bezerra de Menezes. Dessa forma, sob as bênçãos de nosso Senhor Jesus Cristo e o concurso imediato dos Espíritos mensageiros da luz, ele aceitou a convocação e exerceu novamente o cargo de presidente da FEB, de agosto de 1895 a abril de 1900, quando desencarnou.    





Referências Bibliográficas:

ABREU, Silvino Canuto de. Bezerra de Menezes:  Subsídios para a História do Espiritismo no Brasil desde o ano de 1895. Editora: FEESP. Obra disponível em
Adolfo Bezerra de Menezes: Apontamentos bibliográficos. Texto produzido para coletânea da FEB. Disponível em: https://www.febnet.org.br/wp-content/uploads/2012/06/Adolfo-Bezerra-de-Menezes.pdf
Presidentes da FEB. Revista Reformador, abril de 2014.  Disponível em: https://www.febnet.org.br/wp-content/uploads/2014/05/presidentes-da-feb-1.pdf

[1] Ao concluir o curso de medicina, Bezerra ingressou na vida militar como cirurgião-tenente, nela permanecendo por quatro anos. Foi católico fervoroso e profundo conhecedor da Bíblia. Na juventude teve dúvidas sobre a religião que conheceu desde criança e se tornou cético, mas passou a estudar profundamente o Livro Sagrado dos cristãos quando, após cinco anos do seu primeiro matrimônio se tornou viúvo, em 1863.
[2] a) Os “científicos”  -  os que compartilhavam somente do aspecto científico da Doutrina Espírita. Tinham maior interesse somente nos fenômenos mediúnicos.
b) Os “místicos”  -  os que encaravam o Espiritismo como religião.
c) Os “espíritas puros”  -  os que aceitavam apenas O Livro dos Espíritos e o Livro dos Médiuns como expressão da Doutrina dos Espíritos.                                                                                            d) Os “kardecistas”  -  eram os que adotavam todos os livros da codificação espírita.      

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